terça-feira, 30 de agosto de 2016

Dona Virgínia

 

DONA VIRGÍNIA
«Dona Virgínia (...) era muito compreensiva e não menos tolerante à fragilidade humana, somente não podia com bêbados. Verdadeira fobia! E por azar toda a vida fora vítima deles. Mal os via aos tombos, não se continha, era superior às suas forças:
- «Grandessíssima pipa, barril ambulante, desgraçado, desinfeliz, mete-te em casa...»
Não admira que impropérios destes exasperassem os «amantes de Baco».
Numa noite meteu-se com o «Tarro», homem fortíssimo - o mais forte de toda a ilha e talvez seu afilhado.
- «Cara sem vergonha... Sepiterno valdevinhos, vai ter com a tua mulher!»
Depois destas admoestações pressentiu que iria ser perseguida, por aquilo que dissera; enfiou-se em casa de sua comadre Jesuína do Mestre Joaquim. Daí a momentos, de facto, o Tarro estava a preparar-se para meter a porta adentro. A pobre velhinha receando ficar com a casa arrombada, a tremelicar, cheia de medo, deixou-o entrar...
- «Ai tais trabalhos! Aqui d'El Rei quem me acode! Ai Jesus!» Dona Virgínia gritava como as galinhas quando vêem furão ou «bilhafre da rocha» a rondar a capoeira. O pândego, para seu divertir, agarrou as duas múmias e sentou-as em suas enormes pernas. Durante uma hora ou mais, não parou de fazer de cavalinho como se fossem crianças.
Dona Virgínia esgatanhava-o todo, cuspia-lhe, berrava, ao passo que a senhora Jesuína, muito mais prudente, aconselhava a desatinada comadre a acalmar-se. Porém o «velhaco» queria precisamente divertir-se com aquela brincadeira.
E aos solavancos, a pobre velhinha dizia:
- «Quanto mais a comadre gritar pior é, tanto para si como para mim...»
Lá quando Deus quis, o bêbado deixou as «pobres» em paz. Caíram de cama, em «panos de vinagre», sem se poderem mexer, todas «escangalhadas».
Dona Virgínia, na sua paixão, gritava:
«Ai os meus rins
Ai as nhas cadeiras
Não digo o resto
Que são asneiras».»

- in "Memórias da Minha Ilha", Padre Jacinto Monteiro - 1982 (https://goo.gl/mCS4Lj)
- Imagem: Márk Laszlo

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